quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Carta de Quarta



Oi, meu nome é Eduarda* e hoje é 26 de novembro de 2010 ás 23:52

Provavelmente você nunca irá me notar em uma multidão, numa roda de conversa ou em uma festa. Sou fã de celta, rock e metal pesado... O mais pesado e antigo que estiver na vitrine. Dizem que sou muito feliz, mas quem sempre esteve por perto, sabe que isso é uma grande mentira, a mentira mais ridícula que alguém pode falar sobre mim. Acordo todos os dias, e pego minha máscara e a coloco tão bem, que não há do que duvidar, a não ser que você me conheça muito bem, algo que não irá acontecer. Eu realmente não ligo pro que você irá pensar. Por ter me importado tanto, construi meu próprio muro, com as lágrimas que pessoas fizeram cair do meu rosto, e quer saber? Sinto-me muito bem com isso, vitoriosa. Não há como ultrapassá-lo.

Era muito preocupada com o que os outros amiguinhos da escolinha falavam de mim... E por ser, de certo modo, estranha, me afastava dos outros. Nada perceptível, nem para meus pais. Brincava com minhas bonecas, fazia histórias tristes e fúnebres... Eu gostava.

Fui crescendo, e esse lado estranho também, nunca me incomodando muito. Nunca tive muitas amigas, ou amigas que eu realmente considerasse que fosse tal. Muitas pessoas olham pra mim, me invejam por terem muitas pessoas ao meu redor, muitos amigos e uma agenda lotada. Quero que saibam isso também não existe, uma grande farsa.

Há dois anos e meio, após muitos outros lutando, cai em depressão, e foi onde tudo começou. Meses sem rumo, olhar pesado, ir para escola era algo horrível, ver pessoas sorrindo me fazia querer fugir dali, e foi nessa época que conheci um amigo que também tinha quase o mesmo problema, mas esteve comigo, me fez sorrir, e saímos dessas situações tristes, juntos. Anos se passaram e éramos melhores amigos.

Mudei de escola, de amigos, de rotina, mas aquela imensa aflição não passava, por mais guardada que ela ficasse. A realidade ali era completamente diferente, pessoas tristes, mas com rostos e ações felizes, todos ali, buscavam de modos diferentes aplacarem seus problemas. Sim, eu, por tanto tempo encontrei o meu.
Após uma tribulação, não conseguia ver ninguém pra compartilhar o que sentia, buscava algo, na esperança de encontrar qualquer coisa que me distraísse. No fundo de uma caixa, não sei como, havia uma fina e pequena lâmina. Foram os primeiros cortes, os segundos, os terceiros e assim por diante, um sorriso de satisfação se fazia em meu rosto. Não me perguntem por que, mas sempre me satisfiz com filetes de sangue brotando da minha pele. Parece loucura, mas era assim que fugia da realidade.

Um amigo que cuidava de mim, em qualquer situação, percebeu que estava virando um vício, sempre guardava uma lâmina na bolsa. Nenhum lugar, e nem ninguém me impedia de realizar meu pequeno prazer... Lugares escuros, lugares longe de olhares, escola, shoppings, banheiros públicos... E após meses percebendo tal, veio até mim, com olhos cheios de lágrimas e preocupação, me fez prometer que não faria mais aquilo. Eu prometi. Outros meses passaram, e não resisti, quebrei a promessa. E gritando comigo, me fez prometer de novo. Eu prometi novamente, talvez ele tivesse razão.

Agora se passaram dois anos, muitos amigos tomaram seus caminhos... Poucos ficaram. Meu melhor amigo se foi também, difícil, mas algo que superei. Uma das coisas mais difíceis de ver é grandes amigos indo embora (por diversos motivos, e eu não os culpo), dói, machuca, arde de uma forma inexplicável. Talvez essas pessoas nunca irão imaginar a falta que fizeram e fazer, mas isso eu também aprendi a controlar.

Do ultimo ano pra cá, nada tem dado certo. Festas, eventos, reuniões, peças teatrais, jantares... Nada me satisfazem, sempre faltava algo. Sim, sou uma pessoa que sempre espera que me surpreendam, e talvez por isso, me decepcione com freqüência. Há quatro meses, meus dias mudaram de uma forma surpreendente. Conheci alguém que valesse a pena, amigos certos e estáveis, minha família se dando bem, enfim, tudo em uma harmonia estranha e especial... Meus queridos, sempre o que é surreal demais pra se acreditar, tem o pior final que possa ter. Com minhas próprias mãos, sem perceber, fui rasgando isso aos poucos... Nasci com o dom de afastar as pessoas que amo.

Pessoas mudam, promessas são quebradas. Foi um novo inicio de uma depressão terrível, desacreditar de mim mesmo, perda do brilho do meu olhar, fiquei sem perspectiva, sem objetivo, sem motivos pra continuar, lágrimas caiam e cai com freqüência dos meus olhos, meu cabelo começou e está caindo muito. Não irei contar detalhes, nem me fazer de vítima, mas há pessoas que nascem pra viver assim, alguns casos em minha família comprovam isso. Sei que com isso e com algumas escolhas afeto pessoas importantes... Realmente não sei o que posso fazer para evitar, e também não irei viver pra alegrar os outros, e não a mim mesmo. Pode parecer egocêntrico, mas assim é que construo minha própria história, pelo contrário, estarei usando palavras dos outros para escrever o livro da minha vida, e não quero ser mais um ventríloquo de ninguém.

Até hoje, esses conflitos não se findaram, a cada dia, aumentam de proporção, e esse monstro que cresce em mim, também. Filetes de sangue em minha pele já não bastavam, procurei algo que me tranqüilizasse, e me ajudasse a passar essa fase lúgubre. Já fazia semanas que uma única palavra gritava em minha mente conturbada, cedi e busquei o que tanto precisava. Três silabas, cinco letras e uma tarja preta pra complicar a aquisição de tal. Não irei informar o que é e quem me fornece, mas posso dizer que nos primeiros 15 minutos, não faz efeito, em 30 minutos começa o doce efeito, você fica extremamente calmo e relaxado... Brigas, gritaria e stress em minha casa acabaram. Meus problemas ficam numa realidade longe e não consigo me lembrar com clareza dessas situações ruins, elas agora fazem parte de uma memória distante, que vem me incomodar às vezes, mas com um grau de intensidade bem menor. Dá-me uma paz diferente, nesse momento, escrevo sob efeito dele, e consigo até sorrir.

Quero que saibam também que não quero ajuda de ninguém. Posso dizer que me fechei em meu mundo, e fico feliz por não compartilhar com qualquer babaca interesseiro, posso também dizer que há uma única pessoa que entende essa situação, e está lado a lado comigo e com isso... Acabei me apaixonando pela pessoa que mais quer me ajudar.

*Eduarda é um nome fictício, embora a história seja extremamente real.



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3 comentários:

  1. Caara, que tenso.
    Alguém te enviou essa carta? Foi uma carta aberta ao público?

    E Eduarda, não concordo com seu caminho de felicidade. Mas sinceramente torço pela sua.

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  2. Fiquei um tanto pasma lendo isso, e curiosa. Mas querendo ajuda ou não, tente ser feliz. Muito bem Pee, post diferente e muito interessante.

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  3. "Uma das coisas mais difíceis de ver é grandes amigos indo embora (por diversos motivos, e eu não os culpo), dói, machuca, arde de uma forma inexplicável. Talvez essas pessoas nunca irão imaginar a falta que fizeram." e irão fazer... isso explica muito! =/

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